sábado, 3 de outubro de 2009

A Lei Seca e o Pacto de Sao Jose da Costa Rica

Há algum tempo foi editada a Lei 11.705 (Lei Seca) que alterou a Lei 9503 (Código de Trânsito). Ocorre que, o mais aplicado entendimento da alteração legislativa em questão, fere o pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana Sobre os Direitos Humanos), do qual o Brasil é Signatário (Assinou o Tratado Comprometendo-se a Cumprí-lo), tendo-o inserido em seu ordenamento Jurídico através do Decreto Legislativo nº 27/92, o que o faz ter força de Lei Complementar (Acima da Lei Federal e abaixo da Constituição, logo, acima do Código de Trânsito que é Lei federal).

O referido Pacto tem, dentre seus artigos, um que diz o seguinte:
"Pacto de São José da Costa Rica, Artigo 8º:
1. (...)
2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
(...)
g) direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada."

O Código de trânsito Brasileiro, diz, em seu art. 306, diz o seguinte:
"CTB, art. 306. Conduzir veículo automotor, em via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:
Penas - dentenção, de 6 meses a 3 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor."

Além deste artigo, os arts. 165 e 276 falam da infração de dirigir sob influência de álcool no sangue, porém, os meios comprobatórios só vêm descritos no art. 277 que não diz específicamente sobre aparelhos de medição alcólica no sangue, falando apenas que devem ser hábeis a medir a alcolemia do investigado e homologados pelo CONTRAN.

A própria lei dá a possibilidade de recusa de realização dos exames no art. 277, §3º, dizendo que a recusa implica nas penas do art. 165 (multa, etc...), mas não fala nada que configure a recusa como crime.

Porém, o entendimento nas blitz policiais, no sentido de intimidar os condutores (motoristas), é de que a recusa a realizar o teste etilométrico (bafômetro) também enquandra o condutor no crime do art. 306 do CTB. Ocorre que, além deste entendimento ferir o Pacto de São José da Costa Rica, o teste etilométrico através do etilômetro (bafômetro) não é meio capaz de tipificar o condutor no crime do art. 306 do CTB, que, na interpretação estrita da lei, exige exame do sangue do condutor, o que faz com que uma suposição de quantidade de álcool por litro de sangue através de dados recebidos por um aparelho que mede a quandidade de álcool por litro de ar expelido dos pulmões seja inócua para a tipificação da modalidade criminosa em questão (não há crime de dirigir embriagado sem exame de sangue).

Considerando que o Pacto de São José da Costa Rica (do início deste texto) veda a obrigatoriedade de produção de prova contra sí mesmo e, considerando que a recusa a fazer o teste etilométrico implica "apenas" na pena do art. 165 do CTB (multa e suspensão do direito de dirigir), então, caso seja pego dirigindo embriagado recuse-se a fazer os exames que poderá se livrar do crime previsto no art. 306 do CTB (detenção de 6 meses a 3 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor). Caso seja feita a recusa, será tipificada "apenas" a infração do art. 165 do CTB, sendo que ninguém poderá obrigá-lo a produzir prova contra sí mesmo, livrando-se, assim, de ser tipificado em um crime (CTB. art. 306).

4 comentários:

  1. O fato da Autoridade Policial instaurar um I.P para a verificação de materialidade do crime previsto na lei, não implica, necessariamente, na coleta de amostra sanguínea? Se sim, não é muito eficaz negar fazer o teste do "bafômetro", posto que o agente pode ser encaminhado a uma delegacia para apuração do fato.

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  2. Rodrigo.
    Há uma tentativa de equiparar o teste do bafômetro ao exame de sangue no Decreto 6488/08, porém a lei só fala de sangue, ou seja, o decreto não pode alterar o tipo penal sob pena de ferir o artigo 1º do Código penal.
    O encaminhamento à delegacia está previsto no art. 277 do Código de Trânsito, podem ser feitos vários exames, mas o condutor pode se recusar a colaborar, é um direito dele e, enquanto não houver exame de sangue não há crime, embora, conforme disse no artigo, há penalidade administrativa (multa, etc...).
    Ou seja, na verdade nem o bafômetro é meio eficaz pra configurar o crime mas, até mesmo para evitar problemas, aconselho a não fazer nem o bafômetro. E se for levado à delegacia, basta não colaborar pois, enquanto não tirarem seu sangue para exames, você não cometeu crime algum.

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  3. Enquanto esse entendimento prevalecer, continuaremos sendo vítimas de motoristas irresponsáveis que matam protegidos por essa interpretação equivocada do Pacto de São José da Costa Rica.

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    1. Depende. Se você acha que um crime punido com entrega de cestas básicas vai resolver o problema então seu raciocínio pode fazer sentido.
      Há uma série de punições, inclusive perda da carteira de motorista, que independem do etilômetro.
      Inclusive, se acontecer alguma coisa com alguém o motorista responde independente de estar bêbado. Só não fica ninguém preso porque outras leis que deveriam ser aplicadas são aplicadas equivocadamente, o Pacto de São José da Costa Rica está correto, todo o resto que está errado.
      Pra você ter uma idéia quem mata alguém a tiros cumpre uns 4 anos de cadeia apenas, isso quando é pêgo.
      A pena de homicídio culposo, que é quando se atropela e mata alguém, é de cerca de 7 anos, mas ninguém fica preso porque não tem cadeia nem pros bandidos de verdade quanto mais pra quem é cidadão de bem e cometeu um erro embora este erro tenha custado uma vida.
      Eu acho que cadeia deve ser igual a escola (tem que ter pra todo mundo), cometeu um criminho qualquer com pena de 06 meses vai ter que ir pra lá cumprir e se puder pagar cadeia particular que pague e tenham aulas na cadeia, aulas de cidadania, matemática, português, inglês, etc... Porém cadeia é um lugar que só revolta quem fica preso e mesmo quem não é bandido acaba virando. É por isso que ninguém é preso.

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